Helton Kramer Lustoza
A mídia nacional tem chamado atenção acerca da tramitação do Projeto de Lei Complementar 137/2015, de autoria do Senador Flexa Ribeiro, que flexibiliza as regras de criação de novos municípios, gerando uma polêmica que deve ser analisada pela sociedade brasileira.
Relembramos que no período posterior a promulgação da Constituição Federal de 1988 ocorreu a criação de inúmeros Municípios que sequer tinham condições de manter suas atividades administrativas. Claramente se pode notar que a maior parte não apresentava condições de autossustentabilidade financeira, sendo dependentes, quase que integralmente, dos repasses estaduais e federais para suprir seus gastos cotidianos.
Estudos estatísticos demonstram que na década de 90 a criação de Municipalidades ocorreu de uma forma acelerada, sem que ocorresse um estudo prévio de sua viabilidade econômica. Note-se que enquanto que, em 52 anos (1940/1991), 2.917 novos Municípios foram criados, entre 1991 e 1997 – frise-se em apenas 6 anos – foram gerados 1.007 novos entes municipais. Seguindo esta lógica, em 1980, o Estado no Paraná se dividia em 290 municípios, sendo que trinta anos depois, em 2010, o número saltou para 399 (IBGE, 2013).
A respeito deste tema, cabe observar, ainda, que no Estado do Paraná foi realizado uma pesquisa, intitulado Estudo de Viabilidade Municipal (EVM), pelo Tribunal de Contas do Estado, utilizando os dados de receita e despesas enviados pelos próprios entes municipais. Nesta ocasião se constatou que dos 399 municípios paranaenses, 96 são financeiramente insustentáveis – estes com população inferior a 5.000 habitantes – (www.tce.pr.gov.br).
A polêmica ficou ainda mais evidente diante do atual cenário de crise, sendo trazido em pauta diversas ideias e formas de racionalizar o uso do dinheiro público. Uma solução proposta pelo TCE-PR – extremamente drástica e polêmica – seria a fusão de municípios, ou seja, os 96 considerados inviáveis seriam reintegrados aos municípios de origem.
Durante muito tempo esta situação demonstrou que os requisitos constitucionais foram interpretados como um “cheque em branco”, abrindo espaço para uma explosão de emancipações desnecessárias por todo o território brasileiro. E uma das consequências negativas do processo de emancipação desgovernada de Municípios seria a ausência de sustentabilidade financeira. É preciso levar em conta que em muitos casos os Municípios com baixa arrecadação, tem suas receitas quase integralmente direcionadas ao pagamento da folha de salário dos funcionários, não possuindo condições para investir no desenvolvimento da economia e na melhoria da prestação de serviços públicos.
Muito além de se querer avaliar neste momento as futuras emancipações, é preciso analisar a autossuficiência financeira dos pequenos Municípios já existentes, buscando fomentar as suas arrecadações tributárias. Os cidadãos têm o direito de almejar a autonomia de onde moram com a viabilidade econômica de seu ente municipal, a fim de dar azo as demandas sociais existentes.
Esta situação reforça a importância de que a sociedade discuta sobre a emancipação de municípios, bem como sobre a própria necessidade de se incrementar a arrecadação dos entes municipais já existentes. É preciso cobrar os Prefeitos, Vereadores e Secretários Municipais para que tomem medidas que direcionem para este objetivo, como o investimento na área fiscal, conforme determina o art. 37, XXII da Constituição Federal que assim dispõe: “as administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, atividades essenciais ao funcionamento do Estado, exercidas por servidores de carreiras específicas, terão recursos prioritários para a realização de suas atividades…”.
Por isso, acredita-se que os governantes locais devem assumir o compromisso de aprimorar os instrumentos de arrecadação, priorizando investimentos na seara fiscal, para que seja possível manter a médio e longo prazo a sustentabilidade financeira dos entes municipais, evitando, com isso, a necessidade de mudanças precipitadas e/ou desesperadas de elevação das alíquotas dos tributos.
Helton Kramer Lustoza
Procurador do Estado
Professor do Curso de Direito da UNIPAR – Campus Cianorte
www.heltonkramer.com