Um governante ideal

Mentira e verdade são conceitos opostos na ética e moralidade. Podem ser doces ou amargas. A verdade sempre é boa e a mentira sempre má. Isso é do censo comum. Ao me deparar com a mentira contada em prosa e verso por gente chegada ao poder, perguntei aos meus botões como seria um governante ideal, aquele que Platão colocaria no seu mundo das ideias. E ouvi que ele é virtuoso e de caráter. Cuida dos governados sem mentir jamais porque tem a verdade como norte. Ela é premissa maior para um governante ideal, alguém digno para nos governar. Um ser correto, avesso à fraude, e capaz de cuidar das necessidades dos governados. Jamais alguém falso e que mente.

A reflexão me ocorreu em razão do segundo turno das eleições para prefeito da cidade de São Paulo. A imprensa viu e ouviu a afirmação falsa do governador paulista. Na manhã do dia da eleição, seu candidato ao lado e o número 15 no peito de ambos, o governador chamou a imprensa para dizer que o PCC, facção do crime organizado, estaria pedindo votos para o adversário do seu candidato. A afirmação foi desmentida depois da eleição. Não havia qualquer indício ou verdade nisso que não passou de mentira oficial para favorecer o candidato do governador. Vitória nas mãos, o governador se disse arrependido e reconheceu que teria lido isso em algum lugar.

Quê dizer e quê fazer? A inverdade veio de uma autoridade constituída e com acesso a informações privilegiadas dos serviços secretos oficiais. Isso é sério demais e não pode ser esquecido. Que haja processo e condenação. A rigor, a eleição poderia ser anulada. Quanto influiu no resultado final?

Mentiras mostram o caráter do que mente. Na eleição dos Estados Unidos, a mentira também entrou em campo. O candidato republicano, sem pejo nem pudor, afirmou que imigrantes estão comendo pets e Trump foi desmentido ainda no debate eleitoral. Depois apareceu, vivinho da silva, um gato referido que teria sido comido pelos imigrantes. As mentiras, aqui buscam vantagem nas urnas, criminalizando a imigração e imigrantes que o falastrão odeia. Logo ele, às voltas com a Justiça que o acusa de fraude nas empresas e tentativa de fraude eleitoral, além de incentivo à invasão do Capitólio para golpear a Democracia. Se no mundo das idéias de Platão estão os modelos, não há lugar para mentiras que são incompatíveis com um governante ideal.

(Eliseu Auth é promotor de justiça inativo, atualmente advogado).