O que diz o massacre de Aracruz

Eliseu Auth

Algum repentista escreveu: “Cabeça, forte é dizê-lo! Cabeça, que desconsolo! Por fora não tem cabelo e por dentro não tem miolo!” Ele lembra os que querem uma população armada. Sofismam com legítima defesa para as “pessoas de bem”, uma lorota erística. A cabeça pode ter cabelos, mas é o miolo que faz pensar. Dizer que esparramar armas traz segurança é balela que o extremismo direitista alardeia, contrariando a lógica e os números das estatísticas. Armas fazem é disseminar ódio, massacres, mortes, sangue, dor e luto lá onde andam à vontade e de peito aberto. Pior. Essa idéia malsã virou método, filosofia e programa de governos como o nosso que está de saída. E o resultado disso está à vista de todos nós. Contra fatos, não há argumentos.

Lá nos Estados Unidos, armas também andam livres. A indústria do armamento também tem sua bancada da bala, respaldada pelos extremistas republicanos. É gente insensível que não se importa com os massacres em escolas, mercados e aglomerações. Riem-se do bom senso e fazem troça com a liberdade sem limites num mote sem miolo, como diria o repentista que referi. Se palavras voam e o exemplo arrasta, aqui, nesta terra de Santa Cruz, um menino de 16 anos, armas à disposição, há dois anos planejou o massacre de Aracruz, no Espírito Santo. Para se adequar à liturgia nazista, botou roupa camuflada, máscara de esqueleto, suástica de Hitler e deu cabo à idéia malsã: Foi a duas Escolas, matando três professores e uma aluna. Ainda feriu uma dezena de inocentes. Já houve assim tragédia em São Paulo. Não venha outra.

Desde que ingressei no Ministério Público, tenho porte de armas. Nunca portei. Elas são más conselheiras. Só açulam valentia, violência e crimes de ímpeto. Como advogado e promotor de justiça, vi e vivi experiências que confirmam a minha tese e desmascaram a falácia de que as armas trazem segurança à sociedade. Que mães e que pais têm sossego com armas à mão cheia, rodeando seus filhos que precisam ir à escola, à balada, à academia e às ruas? A cabeça precisa ter miolo que faz pensar e ver as conseqüências dessa filosofia assassina que espalha armas e engana que garantem segurança para nós e para os nossos filhos. Se o bom senso voltou ao país, espero que o novo governo revogue coisas como o Decreto 9846/2019 e toda a legislação assemelhada, devolvendo ao Exército a fiscalização, rumo à convivência civilizada. Confio que o ilustrado leitor do Umuarama Ilustrado, inteligente que é, me entende e sabe interpretar o que diz o massacre de Aracruz.

(Eliseu Auth é promotor de justiça inativo, atualmente advogado).