Dr. Eliseu Auth

Eliseu Auth

O pai moderno e o imposto de renda

14/03/2023 06H09

Jornal Ilustrado - O pai moderno e o imposto de renda

Eliseu Auth

Nunca é demais voltar a este artigo que li no FENACON: “O pai moderno passa a vida correndo como louco, em busca do futuro e esquece o presente. Com orgulho, a cada ano, declara seu imposto de renda. Cada nova linha acrescida foi produto de muito trabalho. Lotes, casas, apartamentos, sítio, automóvel do ano, tudo isso custou dias, semanas e meses de luta. Mas, ele está sedimentando o futuro da família… Se partir de repente, já cumpriu sua missão e não vai deixá-la desamparada. Para aumentar os bens ele não se contenta com um emprego só – é preciso ter dois ou três, vender parte das férias e levar serviço para casa. (…) Esse homem esquece que a verdadeira declaração de bens, o valor que conta está em outra página do formulário do imposto de renda. Está nas linhas modestas e quase escondidas onde se lê: “Relação de dependentes”, pessoas a quem deve dedicar melhor seu tempo.

Os filhos, novos demais, não estão interessados em propriedades e aumento da renda. Só querem um pai para conviver, dialogar e brincar. Os anos passam, os filhos crescem e o pai nem percebe. Entregou-se de tal forma à construção do futuro que não participou de suas pequenas realizações. Não os levou ao colégio, nunca foi a uma festa infantil, não teve tempo para assistir à coroação de sua filha como Rainha da Primavera. Há filhos órfãos de pais vivos. O pai para um lado, a mãe para outro. Família desintegrada, sem amor, sem diálogo e sem convivência. Depois de uma dramática experiência familiar, diz o pai que não há tempo melhor aplicado que aquele dedicado aos filhos. Agora estou aqui com o resultado de tanto esforço: construí o futuro e não sei o que fazer com ele, depois da perda de Luiz Otávio e Priscila. De que vale o que juntei se esses filhos não estão mais aqui para aproveitar isso com a gente. Se o resultado de trinta anos de trabalho fosse consumido agora por um incêndio e desses bens não restasse mais que cinzas, isso não teria importância. Os valores mudaram e o dinheiro passou a ser o mínimo.

Se o dinheiro não foi capaz de comprar a cura do meu filho amado que se drogou e morreu. E se não foi capaz de evitar a fuga de minha filha que saiu de casa, se prostituiu e dela não tenho mais notícias, para que serve? Meu filho morreu aos 14 anos e minha filha fugiu um mês antes de completar 15.”

Concluo. Muitos de nós gostaríamos de voltar no tempo ao refletir sobre o pai moderno e o seu imposto de renda.

(Eliseu Auth é promotor de justiça inativo, atualmente advogado).