Dr. Eliseu Auth

liseu Auth

O fetiche por armas

29/04/2024 17H51

Jornal Ilustrado - O fetiche por armas

Eliseu Auth

Meu velho e amarelado Aurélio diz que fetiche é algo a que se atribui poder sobrenatural. Pode ser animado ou inanimado. Morto ou vivo, acrescento eu, mas com fascínio doentio sobre o miserável enfeitiçado. Quem cunhou a idéia do “fetiche por armas” foi Lênio Streck, um lúcido jurista cá do sul que honra as letras como poucos.  Filósofo e intérprete do Direito e do mundo real em que vivemos, ele analisou e condenou um projeto de lei da deputada Caroline de Toni (PL-SC), que autoriza os Estados a legislarem sobre posse e porte de armas. E, pasmem! A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara deu aval à tramitação dessa excrescência jurídica.

Sim. Há quem defende isso, tanto que o fetichismo por armas mandou tocar o imbróglio para ser votado, ferindo de morte o artigo 21 da Constituição. Lá estão os temas que competem à União legislar.  Coisas como autorizar e fiscalizar produção e comércio de material bélico, emitir moeda, declarar guerra e celebrar a paz. Se permitirmos a esparramação de armas a torto e môcho, pode que o atrevimento queira o direito de declarar guerra e emitir moeda para Santa Catarina ou outro estado onde o fetichismo prospera.

Não. Não é assim. Cada estado cuidar das armas do seu jeito seria desorganizar o país. Não se enganem. Empurrados pelos fabricantes, armas viraram mais que tara e obstinação para os celerados extremistas. Um fetiche, como se elas protegessem o cidadão. Precisamos delas, mas nas mãos da polícia e do exército. Talvez, na distante zona rural. Nunca esparramadas entre multidões e aglomerados urbanos. Quando andam por aí, livres e em profusão,  instigam valentia e açulam o braço do crime. Semeiam mortes e tragédias. Não fosse só isso, ainda abastecem o crime organizado das milícias e do tráfico de drogas. Comparem as estatísticas das mortes violentas nos Estados Unidos onde armas andam soltas e nos países que as restringem. Não vê quem não quer. As mães e os pais deste país que digam se ficam tranqüilos com seus filhos nas escolas e nas ruas, em meio à profusão de armas que o fetiche quer.

Quem tem bom senso, quer ordem e paz. E condena o fetiche por armas.

(Eliseu Auth é promotor de justiça inativo, atualmente advogado).