Umuarama

DIREITO

Famílias são surpreendidas com ordem de despejo de imóvel de antigo laticínio

22/11/2023 19H50

Jornal Ilustrado - Famílias são surpreendidas com ordem de despejo de imóvel de antigo laticínio
Os pertences da família foram levados as pressas para uma área coberta em uma das casas vizinhas

Umuarama – Três famílias foram surpreendidas no início da manhã desta quarta-feira (22) com um oficial de justiça às suas portas para o cumprimento de mandado de reintegração de posse do imóvel onde residem há 20 anos. A situação foi em uma propriedade, onde funcionava um laticínio, na avenida Alexandre Ceranto, no Jardim São Cristóvão, em Umuarama.

No local havia três casas, cada uma ocupada por uma família. No total são 14 pessoas, sendo sete adultos (com um idoso e uma pessoa com deficiência) e sete crianças. A mais velha tem apenas 10 anos. Todos são parentes.

Nesta quarta, apenas uma das casas foi demolida por uma retroescavadeira. A ação começou por volta das 7h30 e seguia até perto das 17 horas. O imóvel de três cômodos era ocupado por um homem com deficiência física de 45 anos, sua filha e três netos pequenos. A família foi acolhida pelas outras duas de forma provisória. Os móveis foram colocados em um puxado na residência ao lado, por enquanto. Diante da recusa das famílias em saírem do imóvel, a Polícia Militar foi acionada e acompanhou a situação. Não houve incidentes.

Desnorteada

A dona de casa Angela Brambila, de 30 anos, uma das moradoras dos imóveis, contou que está desnorteada. “Hoje já chorei, já xinguei e estou tentando por minha cabeça no lugar para ver o que fazer”, relatou. Ela contou que residem há mais de 20 anos no local e que as famílias não tem parentes ou para onde ir se foram efetivamente despejadas. “Meus filhos nasceram aqui. Sempre viveram aqui. Meus sogros vieram de Alagoas. Não há parentes aqui”, afirmou. O sogro Marilso Mendonça e Luciano Peixoto da Silva, morador do imóvel demolido, eram ex-funcionários do laticínio.

Angela disse que a orientação que receberam foi para irem para um abrigo, mas ela descarta a possibilidade. “Abrigo é para quem vive na rua. Nós somos família. Não vou para abrigo com a minha família. Lá é lugar de ‘noia’ e nós somos trabalhadores”, afirmou. Ela contou que a revolta é por não ter sido dado nenhum prazo para saírem das casas. “Chegaram derrubando tudo, essa é a minha revolta”, desabafou.

Jornal Ilustrado - Famílias são surpreendidas com ordem de despejo de imóvel de antigo laticínio
Medo de moradores é que reintegração volte a ser cumprida nesta quinta-feira

Sem prazo

Segundo a advogada Angela Peres Giroldo, que está acompanhando o caso pelas famílias, ela chegou a peticionar e a conversar com a magistrada responsável pelo caso, pedindo um prazo para as famílias poderem desocupar os imóveis.

“Protocolei embargos de declaração da decisão pois a juíza violou direitos humanos, não intimou Ministério Público e nem a Defensoria Pública antes da desocupação, e eles nem advogado tinham porque nem tinham sido citados de prazo para desocupação”, afirmou a advogada. Segundo ela, não consta nenhum prazo para as famílias desocuparem os imóveis no mandado de citação e de desocupação.

Emília Giroldo informou que chegou a ter uma reunião virtual com a magistrada, onde reiterou o pedido de prazo, mas aguardava uma manifestação oficial no processo. Até as 19 horas, quando a matéria foi concluída, Emília informou que continuava sem uma resposta.

Pedido de reintegração

A propriedade pertence a Century Industrial de Alimentos Lacteos Ltda que ingressou com uma ação de reintegração de posse da propriedade com área total de 5.242,91 metros quadrados e requereu liminarmente a concessão da desocupação, o que foi concedido pela juíza Maira Junqueira, da 3ª Vara Cível de Umuarama.

Na petição inicial, a advogada da empresa, Lenara Ribeiro, informou que: a requerente cedeu a permissão, via comodato verbal, para que os requeridos, ex-empregados de uma das empresas do grupo da requerente, residissem nos imóveis, onde está instalada uma unidade fabril desativada”. Consta em outro trecho que: “no início de 2016, a requerente informou verbalmente aos requeridos a respeito da intenção de demolição das edificações, esclarecendo que concederia prazo para a desocupação dos imóveis. Contudo os requeridos alegaram que teriam direito a usucapião”.

Ainda segundo consta na petição inicial, houve uma ação de usucapião pelas famílias moradoras do imóvel, que foi rejeitada. A decisão já transitou em julgado.

Defensoria Pública

O Ilustrado entrou em contato com a Defensoria Pública de Umuarama, através do defensor público Cauê Bouzon Machado Freire Ribeiro, que se inteirou do assunto e repassou para o coordenador do Núcleo Itinerante das Questões Fundiárias e Urbanísticas da Defensoria Pública (NUFURB) para verificar quais as providências possíveis. Também informou que um retorno deverá ocorrer possivelmente nesta quinta-feira (23).

Polícia Militar

A Polícia Militar também emitiu nota a respeito do assunto:

“Houve uma situação complexa durante o processo de reintegração de posse conduzido por um oficial de justiça. Durante a ação, houve a saída pacífica de um morador com seus pertences sendo levados para outro endereço, seguida pela demolição do imóvel. No entanto, outra moradora demonstrou relutância em deixar a residência, e considerando a presença de várias crianças no local, o oficial de justiça recebeu ordem da juíza, sua superiora, para adiar o cumprimento da reintegração para um momento posterior. É importante notar que todas as medidas legais foram tomadas, incluindo o acionamento antecipado dos órgãos competentes para o cumprimento da determinação judicial e a não utilização do uso da força por parte dos policiais. Os moradores envolvidos receberam orientações sobre os procedimentos cabíveis diante da situação. Essa é uma situação sensível que envolve não apenas questões legais, mas também considerações humanitárias, especialmente quando há crianças envolvidas. É possível que futuras ações sejam tomadas para assegurar o cumprimento da decisão judicial de forma adequada e respeitosa para todos os envolvidos”.