Helton K. Lustoza

04/07/2021

Como não ter opinião polarizada

03/07/2021 13H28

Helton Kramer Lustoza

Uma reportagem recente publicada no jornal El País (https://brasil.elpais.com/) demonstrou que a Ideologia e partidarismo atrapalharam a resposta à expansão do coronavírus. Estudos mostraram que os danos decorrentes da pandemia eram maiores em regiões europeias onde havia mais divisão entre apoiadores e opositores aos seus respectivos Governos.

Frente ao contexto do atual momento em nossa sociedade é comum ouvirmos falar em polarização. Mas, afinal, o que é polarização e qual seus efeitos na democracia?

Em qualquer conversa do cotidiano as pessoas estão tentando se localizar e se alinhar a determinados grupos: favorável ou contrário a vacina; favorável ou contrário ao lockdown; favorável ou contrário ao tratamento precoce da covid, etc. Em linhas gerais, o significado da polarização é a divisão de uma sociedade em dois polos a respeito de um determinado tema. Ocorre que atualmente essa divisão está sendo drasticamente utilizada para formar grupos que não dialogam entre si, que se fecham em suas convicções e não estão dispostos a debater ideias.

O discurso do ódio se tornou mais visível nas redes sociais, criando uma violência simbólica em relação a grupos ou segmentos da sociedade, classificados entre “NÓS” e “ELES”. E as redes sociais só potencializaram este tipo de discurso, alimentando a necessidade de uma luta contra o “inimigo”, desqualificando-o como sujeito participante da vida social. Seria como se disséssemos que aquilo que não parece comigo, ou aquele que não tem a mesma opinião que a minha, me agride.

O problema do excesso de polarização somada a democratização dos meios de comunicação, resultou na formação de uma espécie de bolhas, através das quais, cada indivíduo acaba tendo contato apenas com opiniões e notícias que reforçam suas ideais. O resultado deste processo será de que cada pessoa apenas acredita nas informações que venham do seu grupo e passa a ter ainda mais certeza de que está certa em seus julgamentos. E as visões e opiniões contrárias se tornam cada vez mais estranhas, absurdas e inaceitáveis.

E mais, não podemos esquecer que atrás da polarização existem muitos grupos e partidos extremistas que se alimentam do descontentamento e da intolerância para ganhar mais apoio popular. E um ambiente polarizado, com predominância da intolerância, reforça e propicia a ascensão de líderes populistas, ou seja, aqueles que têm pouco apreço às normas democráticas e às limitações de poder.

Em meio ao cenário atual, onde a polarização é cada vez maior, faz-se necessário discutir sobre a tolerância, para tentarmos combater o fanatismo com antídotos como aqueles propostos por Amós Oz em seu livro “Como curar um fanático”. Amós foi um escritor com vasta produção literária, que cresceu em Jerusalém, onde vivenciou o conflito entre Israel e Palestina. Diz este autor que o fanatismo começa em casa “com o impulso comum de mudar um parente para o próprio bem dele”, e avalia que este impulso faz do fanático um grande altruísta. Relata o autor que existem aspectos que torna possível identificar um fanático, como a intolerância, o sentimentalismo (em detrimento da razão, o culto a personalidades como líderes políticos, religiosos ou indivíduos carismáticos) e a falta de senso de humor.

Pois bem, uma vez identificado um fanático, como então combatê-lo? O autor nos dá algumas diretrizes, dentre elas defende ser possível combater o fanatismo através do senso de humor, sendo que o “humor é relativismo, (…) humor é a capacidade de perceber que, não importa quão justo você é, e como as pessoas têm sido terrivelmente erradas em relação a você, há um aspecto da vida que é sempre um pouco engraçado”.

Em meio a esta batalha travada em nossa sociedade entre o certo e o errado, podemos seguir o conselho do autor Amós Oz, e, quem sabe buscar encarar a vida com muito mais bom humor. O amadurecimento de um debate democrático exige muito mais do que respostas complexas e bem fundamentadas, uma vez que devemos transformar este tempo de convívio em comunidade como uma fase prazerosa.

Helton Kramer Lustoza

Procurador do Estado

Professor do Curso de Direito da UNIPAR

www.heltonkramer.com