Dr. Eliseu Auth

Eliseu Auth

A presunção da inocência

24/07/2023 17H32

Jornal Ilustrado - A presunção da inocência

De tanto ver juízos hipócritas e apressados chego a duvidar que o bom senso é a coisa mais bem distribuída entre nós. Se não nascemos maus, redes sociais e um certo jornalismo sensacionalista querem desmentir isso. Já foi pior. Pela audiência e para se sentirem importantes fazem juízos debochados sobre uma fatalidade que ninguém quis. Mas que é possível acontecer.

Essas coisas ficaram me incomodando no episódio do homem que teria revivido depois de atestado como morto aqui em Umuarama. Até saiu na imprensa nacional. No mínimo, a dignidade e o profissionalismo do hospital e do médico deveriam ter sido respeitados. Ao que sei, cumpriram todos os protocolos médicos. Na ausculta respiratória não havia movimentos e o exame clínico não registrou artividade cardíaca. Não havendo sinais vitais é caso de morte. A medicina é ciência humana. Não é exata como a matemática e está em contínuo aperfeiçoamento. Ela quer, a todo custo, curar o câncer e ainda não consegue. Saibam os que ficam à espreita da desgraça alheia que é possível não estar em óbito mesmo sem os sinais vitais. Trata-se da morte aparente que tem registros na crônica médico-legal.

A propósito da morte aparente em que a catalepsia não é perceptível nos exames, lembro o festejado processualista penal Fernando da Costa Tourinho Filho. Ao comentar a cautela do artigo 162 do Código de Processo Penal, exigindo que a autópsia só pode ser feita 6 horas após a confirmação da morte, levou em conta a hipótese da morte aparente. E, didático como era, trouxe à baila o exemplo que transcrevo:

Há algum tempo, a revista “O Cruzeiro” deu-nos notícia vinda de Massapé, Estado do Ceará, de que estava sendo realizado o velório de Maria Rodrigues, vitimada por um colapso cardíaco, 7 horas antes. A certo momento, porém, a “defunta” levantou-se do caixão. Houve debanda geral… Depois o velório transformou-se numa festa”. (In PROCESSO PENAL, vol. 3- pág.232- 17ª ed. Saraiva).

Concluo. Grandeza de alma, respeito, cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém. Às favas julgamentos precipitados! É bom, justo e civilizado reconhecer sempre e a todos o princípio da presunção de inocência.

(Eliseu Auth é promotor de justiça inativo, atualmente advogado).