Eliseu Auth
Foi muito bom. O gesto de Vinicius Jr. contra o racismo lá na Espanha foi corajoso e oportuno. Fez e faz o mundo pensar. E quem raciocina um pouco vai ver que a ignomínia está ali, lá e acolá. Mas, também está aqui.
Li que o racismo é conseqüência da escravidão e não o contrário. Na biblioteca tenho parte da obra de um brilhante maringaense chamado Laurentino Gomes que escreve sobre escravidão como ninguém. Diz ele: “No mundo inteiro, desde a mais remota Antiguidade, da Babilônia ao Império romano, da China ao Egito dos Faraós, do Islã da Idade média aos povos pré-colombianos, milhões de seres humanos foram comprados e vendidos como escravos. (in Gomes, Laurentino – “Escravidão”, pág. 25).
Povos e nações foram cúmplices ou protagonistas desse crime e ninguém aponta uma exceção sequer. A organização social sempre se fez com homens livres e homens escravizados. Vou ao berço da nossa civilização. Diz Laurentino Gomes que Atenas, no auge, tinha 70.000 cativos dentre seus 155 mil habitantes. E que se presume ter havido cerca de meio milhão de escravos no Império romano, ao tempo em que o doce Nazareno esteve entre nós.
Escravizar era tão normal que religiões a aceitavam e até participavam. Na tradição judaico-cristã, a cor branca é associada à pureza e o preto à escuridão e ao pecado. O Império Otomano comprava homens e mulheres e mercadores muçulmanos venderam cativos à América. Ninguém ficou de fora. No andar da civilização, cidadãos compravam e vendiam gente como se leiloa gado. Na base da pirâmide social dos países sempre estavam os escravos. Laurentino lembra que o Código de Hamurabi aceitava escravos e até Aristóteles tinha alguns. Thomas Jefferson, autor da Declaração de independência dos EEUU que afirmava a igualdade entre as pessoas também tinha. O humanista e pensador John Locke era ligado a uma empresa que traficava. Para Kant havia diferença de inteligência entre brancos e negros e Hegel os subestimava. Até Voltaire, crítico mordaz das estruturas sociais, via “prodigiosa diferença” entre negros e outros seres humanos. (op. cit. p. 75).
Temos que evoluir. E saber que somos iguais. É a lição do Vinicius.
(Eliseu Auth é promotor de justiça inativo, atualmente advogado).